MULTIVERSIDADE ⬤ Rogério Nuno Costa

MULTIVERSIDADE ⬤ Rogério Nuno Costa
Gaivotas Em Terra

por Susana Mendes Silva

 

Perguntas e comentários para o candidato Rogério Nuno Costa (enquanto arguente na sua defesa de tese):

 

1.

Lê-se na sinopse que Multiversity é a “defesa de uma tese para a especulação (futura) de uma universidade queer, ou uma multiversidade”. Mas, na verdade nunca ninguém defendeu uma tese construída com notas de rodapé enquanto corpo central[1]. Como que tornaste a periferia e os interstícios em centro. É uma operação duchampiana? Ou melhor — já que multiversamos — é uma operação Freytag-Loringhoveniana, Rogério?[2]

 

2.

Para mim, a tua dissertação é uma tese-não-tese; é uma tese-notas; é simultaneamente uma tese-falecida, uma tese-em-acção, uma tese-em-devir e uma tese-futuro; é também uma queer-tese-queer, uma tese-turtorial; uma tese-vida; uma tese-vírus; uma tese-vacina e uma tese-tese. Uma tese é o que, depois do nãos, nos deixam fazer ou é tudo o que, apesar de tudo, conseguimos fazer com ela? É uma vítima ou é como alguém que abre espaço pelo meio de um autocarro cheio em hora de ponta?

 

3.

Na sala, sentaste-te numa secretária de costas para nós. Nessa mesa tens o laptop aberto e em frente um écran de projecção. Quem somos nós, então, neste espaço? Quem se senta atrás do candidato numa defesa?

 

4.

Para mim não há nada melhor do que alguém fazer-nos pensar onde estamos, como estamos, e o que estamos a fazer. A Multiversidade obriga-nos a reflectir, por exemplo, sobre que lugar é uma universidade (ainda não-queer); que espaço têm realmente as pessoas — de todos os géneros e defendendo um modelo de sociedade igualitária onde não pode haver lugar para o colonialismo ou para a falocracia — nesta instituição; mas também como é que as/os artistas podem fazer da sua prática um modelo de investigação sem serem trucidadas/os no processo. Ao fim ao cabo abriste tantas janelas, mas continuamos com falta de ar, não te parece?

 

5.

A Multiversidade é conhecimento em acção e a Universidade é saber morto (cfr. Paul B. Preciado)?

 

6.

Como diria a Cláudia Jardim, no Clube Espectador[3], porque é que insistimos na academia? Em estudar lá, em dar aulas lá, em produzir conhecimento lá?

Aliás, tu próprio afirmas na nota 2:

 

Não sei nada sobre as origens da minha indisciplina. Estou sempre a repetir as mesmas coisas, e sempre que o faço, as mesmas coisas perdem cada vez mais sentido. Tornam-se anedóticas e vazias…

 

7.

Será a Escola da Vida (ver nota 33) a vacina para o vírus da Multiversidade?

 

8.

Relativamente à nota 34 afirmas que “na Multiversidade não se entra, sai-se. Somos todos poetas. E o poeta é um fugi’dor. Foge tão verdadeiramente, que chega a fugir da fuga, a fuga que deveras sente.”

Mas ao contrário do que se poderá pensar nem sempre é fácil sair de uma universidade. Ainda há vagas (para sair) ou é mesmo preciso ser poeta?

 

 

[1] – E também com a Enya, um robot que escorrega em cascas de banana, um meme do Duchamp, etc.

[2]Letters to the editor | Did Duchamp really steal Elsa’s urinal?,  The Art Newspaper, 4 Março de 2020, https://www.theartnewspaper.com/comment/letter-to-the-editor-or-did-duchamp-really-steal-elsa-s-urinal

[3] – Aconteceu no sábado, dia 30 de Maio, às 18h, e tratou-se de uma conversa online moderada por José Vieira Mendes e contou, como sempre, apenas com a presença de espectadores.

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